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domingo, 17 de outubro de 2010

José Angelo Gaiarsa| surrealismo e respiração




A cidade sem fundações | http://www.doutorgaiarsa.com.br/

O sentimento mais incômodo que possuo sobre Santo André é o fato de não haver nela espaços reais para a consolidação do conhecimento. A morte de José Angelo Gaiarsa me fez pensar sobre isso novamente. Ele foi uma das pessoas que visei no final da minha gestão da Casa do Olhar. Fiquei absolutamente impressionado com a capacidade de Gaiarsa e da interdependência entre a formação dele e as acepções que ele alcançou como psiquiatra e o quanto esta experiência foi precipitada nos primeiros anos da sua vida em Santo André.

De um caráter absolutamente genial, Gaiarsa me surpreendeu com milhões de pequenos atos de lucidez em sua face e o que mais me tocou foi o diálogo sobre Surrealismo e respiração. Durante anos ele foi colecionando imagens surrealistas que revelavam importantes anotações sobre a libertação das neuroses e um fato contundente na sua experência como terapeuta, após décadas de trabalho com a terapia corporal, ou seja de que todas as amarras de uma personalidade podem ser vistas na maneira como o sujeito respira. Respiração como chave da personalidade.

Para Gaiarsa, a conquista de uma certa autonomia ou da recuperação de uma determinada liberdade tem a haver com o restabelecimento de uma respiração plena. E para ele, sua maior surpresa foi perceber na obra dos surrealistas a expressão deste fenômeno.

Preparadíssimo, altamente estudioso, Gaiarsa transcorria da neuromedicina à Shiva, o deus indiano, com uma total clareza e liberdade. Foi um dos maiores encontros que a vida me possibilitou. Consegui organizar espaço para que ele falasse sobre esta questão em Santo André, mas infelizmente, não tive a possibilidade em função da transição de Governo em Santo André.

A pergunta que fica, é que apesar de ter feito tanto pelo ser humano e ter sido um profissional agraciado pela mídia, pode-se ou não haver em Santo André uma Fundação que disponibilize seus estudos e seu acervo para o desenvolvimento de mentalidades futuras? Quem sabe na UFABC ou no SABINA?

Passará o mesmo que passa com a memória de Luiz Sacilotto, em que se pronuncia seu nome mas não se propaga o seu conhecimento? Questiono a vida do concretista para homenagear o notável amante da arte surrealista, autor de “a engrenagem e a flor”. Tal símbolo pode comunicar a grande verdade sobre a falta de perspectivas de humanização do cenário que resta industrial no ABC. Em homenagem a este grande andreense aposto na flor como engrenagem, que possamos varrer o marasmo cultural de Santo André e dinamizar a vida cultural da cidade como ele, o Zeca de Santo André, dinamizou sua própria vida. Respirar a cidade. “JC Gaiarsa”, meu súbito e inesperado amigo de milhões de gestos por segundo, que você esteja nesta companhia da eternidade de “JC” que você encontrou e tão bem ampliou através do seu talento para a humanidade e para a psiquiatria! Obrigado por tantos corpos e personalidades mais eretas, tantos olhares erguidos e bem repousados sobre a própria consciência, que com apoio da sua sabedoria estão a caminhar mais livres e pausados pelo mundo! Minha reverência ao grande gênio analítico do comportamento humano que esta cidade gerou: o seu “Olhar” estará para sempre conosco!

Saulo di Tarso|
Artista visual, cidadão andreense, ex-curador da Casa do Olhar Luiz Sacilotto.

2 comentários:

  1. Este comentário foi removido pelo autor.

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    1. Olá, finalmente localizei o livro em que Gaiarsa comenta o que você me perguntou. Quando puder, entre em contato. Abraços, Saulo.

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